No início de Janeiro, a série de entrevistas Perspectivas 2021 ouviu as opiniões do presidente da Câmara Brasil-Rússia de Comércio, Indústria e Turismo, Gilberto Ramos (foto). Ele chama a atenção para o desejo expresso recentemente pelo presidente Vladimir Putin de trabalhar em parceria com o Brasil. Mas ressalta também que os investidores russos ainda estão tímidos para investir no país. Para mudar esse cenário, Ramos afirma que a Câmara está apresentando as novas oportunidades de licitações brasileiras de óleo e gás para as petroleiras da Rússia. “O intuito dessas apresentações que estamos fazendo é justamente demonstrar o potencial das novas jazidas no offshore e no onshore e também nos desinvestimentos da Petrobrás”, declarou. Durante a entrevista, ele comentou ainda como a entidade superou os desafios vividos durante o difícil ano de 2020 e defendeu a criação de regras que atraiam o investidor estrangeiro. “Temos que ter mais investimentos e facilitar a vinda de recursos, sem qualquer viés ideológico, de qualquer país. Evidentemente, com regras claras, contemplando o desenvolvimento de tecnologias conjuntas”, declarou. Vamos agora conhecer as opiniões de Gilberto Ramos:
Como enfrentou os desafios de 2020 com a pandemia apanhando a economia em pleno voo de subida?
Não creio que já estávamos em voo de subida. Entendo que vínhamos taxiando. A ala desenvolvimentista do governo, como os ministros Tarcísio Freitas, Bento Albuquerque e Marcos Pontes, faz um bom trabalho. São pessoas sérias e aplicadas. E, de fato, houve esse baque global. Sendo a Câmara de Comércio Brasil-Rússia uma entidade de classe sem fins lucrativos, fazemos muitos eventos. Tínhamos em nossa grade pelo menos quatro eventos de grande porte na Rússia – e todos foram cancelados.
Um desses contaria com a participação de diversos governadores, no Fórum Econômico de São Petersburgo, que se daria entre 3 e 6 de junho. No âmbito do BRICS, teríamos reuniões empresariais do conselho empresarial. Além desses, haveria um fórum empresarial bilateral que já tínhamos feito no ano anterior, um pouco antes do BRICS. E mais a participação em alguns eventos de alta tecnologia em Moscou e São Petersburgo. Havia ainda, por fim, uma feira de óleo e gás.
Isso nos afetou porque algumas das nossas receitas vinham disso. Evidentemente, alguns dos nossos afiliados não tiveram mais como manter a regularidade. Alguns se mantiveram, como a Liderroll, que é uma empresa de excelência, e que encontra demanda na Rússia.
Foi uma crise muito violenta. Quase 30 mil empresas fecharam no último trimestre, segundo dados do Sebrae. Estamos trabalhando para manter as atividades, e tentar reverter esse processo, através das vendas de parcerias. Tenho uma empresa que atua na área de consultoria e fomento. De maneira que estamos sobrevivendo, graças a Deus. Creio que alguns prestadores de serviço, a indústria 4.0, o comércio eletrônico e os supermercados foram dos poucos que não foram afetados. Mesmo a indústria de óleo e gás deu uma parada.
Buscamos fomentar e apoiar iniciativas, como a vinda do Instituto Gamaleya para cá, em uma parceria com fomento do Fundo de Investimentos Diretos da Rússia (Russian Direct Investment Fund – RDIF). A Rússia tem uma riqueza muito grande no setor de fármacos. E estamos apoiando para que aportem em nosso país brevemente. São soluções que estamos trabalhando.
Quais são as perspectivas do senhor para 2021?
Acabamos de renovar o mandato quadrienal de nossa Diretoria (2021-2024), e vimos fazendo diversos planejamentos. Realizamos eventos virtuais e muitas videoconferências. A Rússia tem uma produção de ponta no setor de placas fotovoltaicas. Em óleo e gás, muitas licitações em curso. Estamos sentindo ainda as empresas russas um pouco retraídas face às possibilidades, mas fizemos agora no mês de dezembro, e seguiremos em janeiro com reuniões individuais com alguns dos maiores produtores de óleo e gás da Rússia (com exceção das afiliadas Rosneft e Gazprom, que já possuem escritórios no Rio) visando atrair essas empresas para as próximas licitações. O intuito dessas apresentações que estamos fazendo é justamente apresentar o potencial das novas jazidas no offshore e no onshore, e também nos desinvestimentos da Petrobrás. Estamos trabalhando também muito fortemente com a indústria de bens de capital, no sentido de buscar parcerias com os russos.
Firmamos um acordo operacional no início do ano com a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB) e temos conversado com o presidente Venilton Tadini e sua diretoria. Aprofundamos também nossas relações com a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), tendo realizado um grande webinar em 17 de novembro, com a presença de nosso parceiro, o Viva Bank, um banco brasileiro de desenvolvimento. Já neste início de janeiro, retomaremos diversas gestões tendo em vista a realização das reuniões, em abril/maio, da Comissão Intergovernamental de Cooperação (CIC) Brasil-Russia e da Comissão de Alto Nível (CAN) Brasil-Rússia.
De maneira que não podemos ser nem otimistas nem pessimistas hoje em dia. Temos que ser realistas. Devemos procurar soluções para essa situação extremamente delicada, onde estamos tendo que nos reinventar, buscar soluções dentro das nossas áreas de competência, e trazer especialistas de áreas diversas para uma força-tarefa.
Se o senhor fosse consultado, quais as sugestões e recomendações faria para o governo neste ano que está prestes a começar?
Apenas um percentual pequeno de 15% das verbas de socorro destinadas às empresas chegou até a ponta final. Existem dificuldades diversas. Muitas empresas já eram negativadas, e tinham seus cadastros comprometidos. Dentro desse cenário de tanta quebradeira e aflição, não se pode manter as regras anteriores, que só beneficiam os bancos. Mesmo com essa recessão, os bancos comerciais tiveram lucros de mais de R$ 60 bilhões, ao longo de 2020, grande parte com a inadimplência de seus clientes, algo que poucos sabem.
Vejo que as autoridades da área econômica tentam encontrar soluções, mas meramente paliativas. O próprio BNDES está encontrando terríveis dificuldades para apoiar de fato empresas em dificuldades. Esse número de apenas 15% dos valores de auxílio que chegaram até a ponta final é muito tímido. Por exemplo, nos Estados Unidos esse índice chegou a mais de 90%.
O Presidente Bolsonaro, que acredita em seus ideais, tem de apoiar mais a bancada desenvolvimentista, incluindo o seu próprio chefe da Casa Civil, o general Braga Neto, e os ministros Tarcísio Freitas, Bento Albuquerque e Marcos Pontes, em detrimento dessa “ciranda financeira”. Em nosso entendimento, o presidente precisa se cercar de quadros, principalmente na área econômica, que se coordenassem melhor com a bancada de produtores, com a indústria, e o setor de serviços. Percebe-se claramente uma falta de coordenação, de um planejamento estratégico. Isso, sem falar da crise na saúde, face à pandemia.
A dinâmica geopolítica do mundo se move em um ritmo cada vez mais rápido. Na última reunião do Brics, o chefe de Estado russo, Vladimir Putin, declarou que tem todo o interesse em trabalhar com o Brasil. O ano de 2021 pode representar uma virada, já que estamos mais adequados. O Brasil, com a maior reserva mundial de minerais, a maior reserva de água potável, segundo maior produtor de commodities agrícolas e subprodutos, e com condição de implementar a tecnologias de ponta nesses segmentos. Para isso, temos que ter mais investimentos e facilitar a vinda de recursos, sem qualquer viés ideológico, de qualquer país. Evidentemente com regras claras, contemplando o desenvolvimento de tecnologias conjuntas.
Nisso, vejo um potencial enorme entre o Brasil e a Rússia. Chamo mais uma vez a atenção para a sinalização do presidente Putin sobre o apoio que pretende prestar ao Brasil, dada durante a última Cúpula do BRICS, realizada em 17 de novembro.
Sigamos firmes em frente.
(Fonte: Petronotícias)