No contexto do boletim expedido pelo Itamaraty, acerca das discussões entre os Ministros das Relações Exteriores dos Países BRICS, havidas em 25 e 26 de Julho de 2019 no Rio de Janeiro, foram salientadas questões nas áreas mais sensíveis, de cunho geopolítico e estratégico, conforme o comunicado à imprensa feito ao término dos diálogos entre os Chanceleres do agrupamento, transcrito em sua íntegra nas linhas abaixo.
Consideramos que avanços consideráveis foram obtidos. Acrescente-se que as autoridades dos quatro países lotadas no Brasil, juntamente com representantes do governo federal, estadual e do município do Rio de Janeiro, entidades de classe brasileiras e as câmaras bilaterais de comércio trabalharam ativamente ao longo dos últimos meses, com o objetivo de adensar e expandir de forma efetiva as relações econômico-comerciais, industriais, científico-tecnológicas, culturais e de investimentos entre os cinco países, objetivo que será facilitado através do suporte financeiro do “New Development Bank” (NDB), o chamado “Banco do BRICS”, em vias de ter uma agência instalada nos próximos meses no Brasil.
As delegações chinesa e indiana promoveram seminários empresariais, expondo os principais potenciais de negócio existentes, e representantes empresariais brasileiros que trabalham com a Rússia mantiveram encontros com o Chanceler Lavrov e seus assessores, expressando o alto grau de interesse de fomento aos negócios em áreas estratégicas, tais como infraestrutura, óleo, gás, e da geração de fontes alternativas de energia, automotivo, farmacêutico, da economia criativa, e das inovações tecnológicas multidisciplinares, em linha com o direcionamento dado pelo governo brasileiro, que adotou o mote “BRICS: crescimento econômico para um futuro inovador” neste ano de sua presidência do Grupo.
Dias antes do início destas reuniões, em coletiva de imprensa dada pelo Presidente Jair Bolsonaro, este frisou que “o Brasil está de braços abertos para o desenvolvimento das relações econômicas no âmbito do BRICS”, ressaltando que deve haver o espírito de parceria, tendo sido endossado pelo Ministro Onyx Lorenzoni, assinalando que ”o Brasil tem o maior programa de concessões e privatizações do mundo, não havendo paralelo em nenhum outro país do mundo”. Este ainda sublinhou: “sendo muito claro, parcerias para ferrovias, rodovias, portos, aeroportos, linhas de transmissão e geração de energia elétrica e fotovoltaica junto aos países BRICS serão muito bem vindas”.
Ao final, Rússia, Índia, China e África do Sul assinalaram total apoio ao Brasil por sediar a 11ª Cúpula do BRICS, a se realizar nos dias 13 e 14 de novembro de 2019, que será precedida de eventos empresariais em 11 e 12 de novembro, e comprometeram-se a atuar conjuntamente para o pleno sucesso destes encontros.
Comunicado à Imprensa / Ministério das Relações Exteriores – Nota 197
1. A reunião dos Ministros de Relações Exteriores / Relações Internacionais do BRICS ocorreu em 26 de julho de 2019, no Rio de Janeiro, Brasil, com representação da República Federativa do Brasil, da Federação da Rússia, da República da Índia, da República Popular da China e da República da África do Sul.
2. Os Ministros trocaram impressões sobre assuntos centrais da agenda internacional. Também avaliaram com satisfação o progresso da cooperação no âmbito do BRICS, a qual inclui respeito mútuo e entendimento, igualdade, solidariedade, abertura, inclusão e cooperação mutualmente benéfica. Os Ministros concordaram em aprofundar a cooperação do BRICS em seus três pilares, nos setores de economia, paz e segurança e intercâmbio entre pessoas.
3. Os Ministros reafirmaram o compromisso de manter e respeitar o direito internacional, bem como um sistema internacional no qual estados soberanos cooperam para manter a paz e a segurança, para avançar o desenvolvimento sustentável e para garantir a promoção e a proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos. Sublinharam o apoio ao multilateralismo e ao papel central das Nações Unidas nas relações internacionais, e o compromisso de manter os princípios e propósitos consagrados na Carta das Nações Unidas. Reiteraram a urgente necessidade de fortalecer e reformar o sistema multilateral, inclusive a ONU, a OMC, o FMI e outras organizações internacionais. O sistema internacional, incluindo as organizações internacionais, em particular as Nações Unidas, que os Ministros enfatizaram precisar ser conduzida por seus Estados Membros, deve promover os interesses de todos. Os Ministros reafirmaram o compromisso com os princípios de respeito mútuo, igualdade soberana, democracia, inclusão e colaboração reforçada, bem como com a construção de um futuro comum mais promissor para a comunidade global, por meio de cooperação mutualmente benéfica. Para esse fim, a governança internacional deve ser mais inclusiva, representativa e participativa.
4. Os Ministros recordaram o Documento Final da Cúpula Mundial de 2005 e reafirmaram a necessidade de uma reforma abrangente das Nações Unidas, inclusive de seu Conselho de Segurança, com vistas a torná-lo mais representativo, eficaz e eficiente, e ao aumento da representatividade dos países em desenvolvimento, de modo que possa responder adequadamente aos desafios globais. China e Rússia reiteraram a importância que conferem ao status e ao papel de Brasil, Índia e África do Sul nas relações internacionais e apoiam sua aspiração de desempenharem papéis mais relevantes na ONU.
5. Ressaltaram a importância de esforços contínuos para tornar as Nações Unidas mais efetiva e eficiente na implementação de seus mandatos. Encorajaram a intensificação da colaboração entre os países do BRICS sobre a melhoria dos recursos disponíveis para a ONU, sua administração e orçamento, a preservação de sua natureza de Organização controlada pelos Estados Membros e para garantir uma melhor supervisão e fortalecimento da Organização.
6. Os Ministros reafirmaram seu compromisso com a paz e a segurança internacionais e sublinharam o imperativo de enfrentar os desafios por meios políticos e diplomáticos, e a necessidade, nesse sentido, de evitar todas as medidas, especialmente as coercitivas, que sejam inconsistentes com a Carta das Nações Unidas. Enfatizaram a necessidade de continuar a trabalhar conjuntamente nas áreas de desarmamento e não-proliferação, inclusive por meio da garantia da sustentabilidade a longo prazo das atividades no espaço exterior, bem como da prevenção da corrida armamentista no espaço exterior. Os Ministros reconheceram o relevante trabalho conduzido pelo Grupo de Peritos Governamentais das Nações Unidas sobre a Prevenção da Corrida Armamentista no Espaço Exterior e expressaram sua decepção pelo fato de o Grupo não ter sido capaz de alcançar consenso em seu relatório. Os Ministros tomaram nota do papel singular do Comitê das Nações Unidas sobre Usos Pacíficos do Espaço Exterior na elaboração da agenda “Espaço 2030” e de seu plano de implementação, em consonância com a Resolução 73/6 da AGNU.
7. Os Ministros enfatizaram a importância de cumprir e fortalecer a Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, da Produção e do Armazenamento das Armas Bacteriológicas (Biológicas) e Tóxicas e sobre a Sua Destruição (BTWC), inclusive por meio da adoção de Protocolo à Convenção que preveja, inter alia, um mecanismo de verificação eficiente. Reafirmaram que a BTWC é o instrumento central quanto a armas biológicas e tóxicas. Suas funções, inclusive no que concerne ao Conselho de Segurança da ONU, não devem ser duplicadas por outros mecanismos.
8. Os Ministros expressaram preocupações com conflitos e situações no Oriente Médio e no Norte da África e em várias outras regiões que têm impacto significativo tanto em nível regional quanto internacional. Concordaram que, independentemente de seus contextos históricos e naturezas distintas, os conflitos naquelas regiões devem ser resolvidos de acordo com os princípios do direito internacional, do diálogo e de negociações. Endossaram o Comunicado à Imprensa da Reunião de Vice Ministros/Enviados Especiais do BRICS (MENA), ocorrida em Brasília, em 4 e 5 de julho de 2019, e acordaram que aqueles conflitos e situações requerem avaliação e atenção continuadas.
9. Os Ministros reiteraram apoio aos esforços nacionais e internacionais para alcançar um processo de paz e reconciliação “liderado por afegãos e de propriedade afegã”, bem como para construir um país pacífico, seguro, unido, estável, próspero e inclusivo, que exista em harmonia com seus vizinhos. Expressaram preocupação com a deterioração da situação no Afeganistão, particularmente o aumento em número e intensidade dos ataques relacionados a terroristas contra a Força de Segurança Nacional Afegã, o governo e os civis.
10. Os Ministros saudaram os recentes desdobramentos para alcançar a desnuclearização completa da Península Coreana e preservar a paz e estabilidade no nordeste asiático. Reafirmaram o compromisso para uma solução pacífica, diplomática e política para a situação.
11. Os Ministros expressaram preocupação com a elevação das tensões na região do Golfo e conclamaram por uma solução política pacífica por meio do diálogo e do engajamento diplomático.
12. Os Ministros deploraram recentes ataques terroristas, inclusive em alguns países do BRICS. Condenaram o terrorismo em todas as suas formas e manifestações, cometidos em qualquer parte do mundo e por quem quer que seja e consideraram atos terroristas como criminosos e injustificáveis, que não devem ser associados a qualquer religião, nacionalidade, grupo étnico ou civilização. Eles conclamaram por esforços concertados para combater o terrorismo sob os auspícios da ONU e sob firmes bases legais internacionais, reconheceram o papel primário dos Estados e seus órgãos competentes na prevenção e no combate ao terrorismo e expressaram sua convicção de que uma abordagem abrangente é necessária para assegurar resultados efetivos contra o terrorismo, o que deve incluir combate à radicalização, ao recrutamento, às viagens de combatentes terroristas estrangeiros, o bloqueio de recursos e outros canais de financiamento de terroristas, inclusive, por exemplo, por meio do crime organizado através de lavagem de dinheiro, suprimento de armas, tráfico de drogas e outras atividades criminosas, desmantelamento de bases terroristas e combate ao uso indevido da internet por entidades terroristas mediante utilização imprópria de tecnologias de informação e de comunicação (TICs). Recordaram a responsabilidade de todos os Estados na prevenção do financiamento a redes terroristas e de ações terroristas oriundas de seus territórios. Também pediram a rápida adoção de Convenção Abrangente sobre Terrorismo Internacional pela Assembleia Geral da ONU. Enfatizaram a importância de prevenir e combater o financiamento ao terrorismo e saudaram a adoção da Resolução 2462 (2019) do CSNU. Para tratar da ameaça do terrorismo químico e biológico, enfatizaram a necessidade de iniciar negociações multilaterais sobre uma convenção internacional para a supressão de atos de terrorismo químico e biológico, inclusive na Convenção sobre Desarmamento.
13. Os Ministros reconheceram o progresso logrado no âmbito do BRICS na cooperação na área de combate ao terrorismo, por meio do Grupos de Trabalho de Combate ao Terrorismo do BRICS. Aguardam com ansiedade os resultados do 4o Encontro do Grupo de Trabalho do BRICS, inclusive o estabelecimento de sub-grupos de trabalho para temas específicos, e o Seminário sobre Terrorismo, que será realizado no Brasil, entre 29 de julho e 2 de agosto de 2019.
14. Os Ministros também reafirmaram seu compromisso de apoiar a cooperação internacional no combate a fluxos financeiros ilícitos provenientes de todos os tipos de atividades criminosas, inclusive no âmbito do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) e na Organização Mundial de Aduanas. Nesse particular, ressaltaram a importância de melhorar o intercâmbio mútuo e o compartilhamento de dados. Enfatizaram a importância de preservar e apoiar os objetivos do GAFI, assim como de intensificar a cooperação para implementar e aprimorar os Padrões de Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo e Proliferação.
15. Os Ministros reafirmaram o compromisso de fortalecer o quadro jurídico relacionado à resolução de casos de corrupção, de acordo com a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e outros princípios e normas multilaterais. Incentivaram o Grupo de Trabalho do BRICS de Cooperação Anticorrupção a continuar seu trabalho nessas questões. Os Ministros também sublinharam seu compromisso de promover a cooperação internacional para a recuperação e devolução de ativos ilícitos, bem como a extradição de fugitivos, de acordo com os sistemas jurídicos domésticos.
16. Os Ministros ressaltaram a importância de um ambiente aberto, seguro, pacífico, estável, acessível e não discriminatório para as tecnologias de informação e comunicação (TICs). Enfatizaram a importância de normas, regras e princípios multilateralmente acordados para o comportamento responsável dos Estados no âmbito das TICs. Defenderam a centralidade das Nações Unidas nas discussões sobre temas relacionados a TICs, sem prejuízo de outros fóruns internacionais relevantes. Nesse sentido, saudaram o estabelecimento de grupo de trabalho de composição aberta sobre o tema na ONU, bem como o lançamento de nova edição do Grupo de Peritos Governamentais (GGE). Ao prometerem pleno apoio a ambos mecanismos, os Ministros ressaltaram que o processo em dois trilhos pode gerar complementaridade e sinergias entre os esforços internacionais sobre o tema.
17. Os Ministros expressaram preocupação quanto ao crescimento do uso indevido e criminoso das TICs e reconheceram a crescente lacuna entre a autorização legal para obter, em tempo hábil, evidências vitais e os desafios tecnológicos para fazê-lo, o que é um complexo problema que requer urgente e continuada atenção internacional. Os Ministros reconheceram o progresso logrado na promoção da cooperação conforme o Mapa do Caminho do BRICS de Cooperação Prática para Garantir a Segurança no Uso das TICs e reafirmaram a necessidade de aprofundar a cooperação prática no enfretamento de ameaças e desafios de segurança no uso das TICs. Os Ministros incentivaram a 5a Reunião do Grupo de Trabalho dos BRICS sobre Segurança no uso das TICs a aprofundar a cooperação nesse tema.
18. Os Ministros notaram que eventos importantes como a Cúpula dos ODS e a Cúpula de Ação Climática da ONU serão realizados durante a 74ª Assembleia Geral da ONU em setembro, e esperam que esses eventos produzam resultados positivos. Reafirmaram seu compromisso com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, bem como com a plena implementação do Acordo de Paris adotado sob os princípios da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), inclusive o princípio de responsabilidades comuns porém diferenciadas e respectivas capacidades, à luz de diferentes circunstâncias nacionais.
19. Os Ministros enfatizaram a centralidade das pessoas no BRICS e em seus programas e apoiaram os esforços para aprofundar os intercâmbios interpessoais e de cooperação cultural, especialmente nas áreas de esportes, juventude, filmes, educação e turismo, de modo a aumentar o conhecimento mútuo, a amizade e a cooperação entre seus povos.
20. Rússia, Índia, China e África do Sul estenderam seu pleno apoio ao Brasil por sediar a 11ª Cúpula do BRICS em 2019 e comprometeram-se a trabalhar juntos para o seu êxito.
21. Os Ministros aguardam ansiosamente sua próxima reunião à margem da 74ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas.